domingo, 17 de julho de 2011

Meus olhos, minha janela...

Quando vou à janela e me ponho a olhar a paisagem, através de uma pequena brecha que fica entre dois edifícios, consigo alcançar um pedaço de muro do Batalhão da cidade, um corredor minúsculo de asfalto, luzes que brilham bem mal dispostas ao longe, uma torre não sei de quê, cerca de meia dúzia de árvores e um pedaço bem pequeno de céu que, para minha felicidade, ainda permite que a lua transite  alguns minutos por ali. Esses dias me concentrei  no muro e no asfalto, enquanto me esforçava pra decifrar um movimento que acontecia entre esses dois substantivos bem concretos, ele, aquele movimento, aquele trapo de vida que muitas vezes desvio do meu caminho, que vive pelas imediações, andando de um lado para outro, se agarrando a “não sei o quê” para manter-se   pulsando, que desmaia nas calçadas, de fome e de frio (porque dormir é para poucos), este de quem vos falo, pulando feito um cabrito assustado, em busca de um calorzinho quem sabe, se enfiando entre os carros só pra constranger os motoristas e as famílias que voltavam de jantares, de festas, de passeios, me roubou a paisagem. As luzes se apagaram e os  pensamentos  machucaram meu coração, dilaceraram a  minha auto imagem de “boa pessoa “, percebi o quanto tenho sido tijolo, porque fria e dura e insensível, tenho fechado meus olhos – minhas verdadeiras janelas – para tudo que possa me tirar do conforto da rotina, do equilíbrio, do insosso. Tenho escolhido a paisagem, tenho selecionado friamente, talvez para que “viver”  seja sempre muito bonito e agradável como a gente vê nesses sites de relacionamento.  Tenho construído muros para me livrar da angustia,  a angustia da responsabilidade, para me livrar de SARTRE.
Sou responsável por ele  mas preferi , até hoje, chamá-lo de “perdido”,” maluco”, “marginal”, “drogado”, como se todos esses adjetivos me tirassem a responsabilidade . Não tiram, mas, legitimam a hipocrisia, a “DIVA  da atualidade” que transita entre todos os “mundos”, com autorização e registro em sindicato! Vamos levantar bandeiras, vamos cuidar melhor dos animais, adotar um cãozinho perdido, abaixo as touradas etc, etc, etc...
Mas quem abraça o seu igual¿ quem lhe oferece abrigo¿ quem lhe dá de comer¿  - “Ah mas um prato de comida não vai fazer diferença”- realmente, não faz, não para quem não tem fome!  Tenho vergonha de ter fechado os olhos, tenho mais vergonha ainda de não saber  o que fazer, não saber o que fazer com todos os “eles” que têm atravessado assim, sem pedir licença, o meu caminho! Talvez você os tenha visto por ai, virando um lixo, implorando um pedaço do teu “sandwich”, pedindo “dois real”  para encher a cara no boteco (confesso que é isso que eu faria) ou misturados  à vira-latas sobre caixas de papelão para amenizar o frio! Ainda de olhos fechados,  que é quando melhor me vejo,  quero seguir a luz,  não àquelas que ele me roubou,  mas,  está muito,  muito  escuro!  E em meu silencio constrangedor, percebo que há um Caminho, uma Verdade, uma Vida e que para bons  entendedores,  poucas palavras bastam!

É isso que tenho por hoje, acho que já descasquei parede demais!  




Este texto foi publicado da REVISTA VIE CATARINA  Nr 2 
acesse o link e veja a revista online
http://ver.viecatarina.com.br/
 

Um comentário:

  1. Wynia, sempre gosto dos seus textos, mas confesso que este foi especial, mexeu comigo. Sou sempre a "politicamente correta", sou a "revolucionária", e vendo a hipocrisia camuflada em todo rótulo me pergunto "o que fazer?" para que exista de verdade a política e a revolução.
    Beijos, saudades.

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